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X-Acto

Os x e os actos e algumas coisas de cortar os pulsos



Quarta-feira, 20.11.13

O imprevisto está à espera de uma oportunidade.

Tive o privilégio de ainda ser aluna deste senhor. Por causa dele não me desiludi tanto quanto podia com o 1º ano de universidade que me pareceu na maior parte do tempo um retrocesso face ao exigente 12º ano com excelentes professores que tinha tido.

Mas as aulas com Adriano Moreira eram diferentes. Porque ele é, de facto, um professor em todo o sentido do termo. Um contador da História e um humanista.

Hoje deixo aqui este excerto da entrevista à Renascença que vale pelo todo mas sobretudo por esta frase: O imprevisto está à espera de uma oportunidade.

 

"A legitimidade de exercício do Governo tem sido bastante afectada"

Que propostas alternativas à austeridade é que devem ser colocadas em cima da mesa?
Só conheço uma sede onde podem ser modificadas estas orientações: chama-se Conselho Europeu. Conheço outra sede, que nunca foi experimentada, que é o Conselho Económico e Social das Nações Unidas. E é aí que as coisas têm que ser discutidas. A situação, apesar de algumas certezas que os economistas têm e depois os resultados não correspondem, é a seguinte: juízos de certeza ninguém pode fazer; juízos de probabilidade são uma audácia; e juízos de possibilidade devem ser feitos sempre com a prevenção de que pode acontecer outra coisa. O que me leva a concluir que o imprevisto está à espera de uma oportunidade.

O que é que quer dizer com isso?
Você não pode adivinhar os resultados. O imprevisto está à espera de uma oportunidade.


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por sparks às 20:26

Segunda-feira, 18.11.13

O falhanço funciona. O terror funciona. As semelhanças ficam por aqui

 

Se dissessem há uns tempos que sentiria a falta de aqui vir como se sente a falta de alguém de quem gostamos, de um sítio onde nos sentimos bem ou do de um ritual que nos devolve a nós mesmos, quase aposto que me riria. A verdade é que aqui estou, depois de mais de uma semana, com aquele contentamento infantil que é o mais genuíno vida fora.

 

Ainda por cima, a semana que passou foi rica. Rica de pessoas, ideias, gestos, aquele tipo de riqueza sobre a qual gosto de escrever. Talvez por isso foi mais importante viver esses momentos do que escrever sobre eles. Não é totalmente verdade. Quis escrever quase em tempo real, precisamente porque estas são as coisas a que a escrita dá uma dimensão de eternidade. Não consegui e tenho pena. Hoje vou tentar aqui deixar algum registo desses dias, sabendo antecipadamente que vou falhar - os dias e as pessoas foram melhores do que serei capaz de dizer.

 

Começo por isso mesmo - falhar.

Soube da Sónia Fernandes há uns meses. Porque procurava - e procuro - pessoas com quem possa trabalhar, 'com' e não 'para'. Ouvi falar da Sónia porque alguém conhecia alguém que sobre ela dizia : 'parece impossível como é que ninguém emprega esta rapariga'.

Esta rapariga tem uma história comovente, bem-humorada, contagiante. Esta rapariga merece ser 'bem empregada', mas ela sabe-se empregar tão bem - e se calhar é por isso que outros têm mais dificuldade em empregá-la.

A Sónia é a organizadora do World Failurists Congress, que vai para a 3ª edição, agora em Dezembro. No tempo do ai-que-bom-é-ter-sucesso-e-ser-empreendedor-líder-ou-socialmente-responsável, a Sónia fala com os que falham. Que somos só todos nós. E fala do falhanço sem powerpoints, sem teses pseudo-científicas de gestão ou de psicologia, sem medos. O que faz destes encontros e de tudo o que os antecede uma experiência única, divertida, imperdível e da qual, acredito, se sai com a alma mais leve.

No próximo World Failurists Congress vou falar das vezes que falhei, das vezes que falho, do que isso me trouxe, do que isso me traz. Num ano como o de 2013 é a verdadeira cereja no topo do bolo. Imaginem um investor pitch ao contrário e terão uma boa ideia do que se vai passar.

Só conversei com esta rapariga pessoalmente durante cerca de 2 horas (deviam ter só 30 minutos, o resto foi a crédito). O resto são mails, posts e conversas de terceiros. Mas há um conforto de me sentir em casa inegável e esses são momentos preciosos.

 

Na semana que passou foi também lançado o livro 'Terror ao Pequeno-Almoço'. Ainda não leram? Leiam.

O livro fala de pessoas que mentem, que gerem pelo medo, que procuram salvação em reports e gráficos coloridos. O livro fala de pessoas que obedecem, que vivem em ansiedade, que desaprendem qualquer dom de pensar pela sua própria cabeça. O livro fala de tudo isto e, ainda assim, fala de esperança. No início da sessão de lançamento, uma das primeiras questões foi precisamente sobre se o terror funciona. Respondeu João Vieira da Cunha, um dos autores. 'Claro que funciona e funciona sempre. É como a batota, também funciona. O que não significa que devemos gerir as pessoas pelo medo só porque funciona'. Foi este o princípio de uma conversa em que se falou das retóricas da gestão (hoje são também as retóricas da política) com os palavrões, uma vez mais, do empreendedorismo, da liderança, da inovação e blá-blá-blá a servir para falar da divisão do átomo, do cachorro quente da esquina ou de um qualquer sounbyte extremosamente ensaiado por um qualquer spin doctor. E da culpa, aquela culpa que nós portugueses somos tão bons a sentir e que nos faz aceitar sem pestanejar as mais estranhas provações.

Este é um livro escrito por três autores com percurso académico e com experiência de empresa (João Vieira da Cunha, José Manuel Fonseca e Rui Grilo) e com prefácio do jornalista e comentador Camilo Lourenço. Não são relatos anestesiados. São retratos reais. 

O melhor neste livro, nestes autores, e no conjunto de pessoas que de alguma forma participou nesta publicação é que nos dão o descanso de saber que continua a existir pensamento. Que não nos tornámos todos papagaios que só reproduzimos o que nos soletram. E que bom é ouvir gente capaz de pensar pela própria cabeça e pelo próprio coração.

 

Ah, e fui ver o filme sobre a Wikileaks e o Julian Assange, um convite em boa hora de quem sabe que gosto destas histórias. Gostei do livro do David Leigh e do Luke Harding, gostei de várias provocações de Assange, gostei de várias discussões em que já me envolvi sobre se a tecnologia, as redes, o 'ecossistema' dispensam a função jornalística. O 'Quinto Poder' tem muito de Assange, mas tem o suficiente da grande questão de fundo sobre afinal o que é informar neste início de século XXI. O desempenho de Benedict Cumberbatch é soberbo. Alguns supostos 'efeitos especiais' são mero adereço desnecessário. Há uma ideologia de suporte à narrativa, mesmo que procure ser indelével. O filme foi o maior fracasso dos grandes sucessos anunciados à data da estreia. Ninguém quer saber de jornalistas e hackers.

 

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por sparks às 22:40

Domingo, 10.11.13

Talvez uma fé exagerada nos números

Temos números, previsões, máquinas que processam dados. Temos estatísticas, audiências, projecções. E temos exércitos de garotos que militam nos bancos das universidades de economia, engenharia ou matemáticas aplicadas e que saem de lá com toda a teoria de previsão do futuro. Temos tudo isto a baixo preço, porque as máquinas são hoje infinitamente mais baratas e os jovens Houdinis das previsões são hoje infinitamente mais baratos.

 

Como temos tudo isto, as decisões que todos os dias se tomam são, mais do que nunca, racionais. Ou, como dizem os seus defensores, suportadas em evidências e em dados objectivos. Os números não mentem, as pessoas e as suas convicções, sonhos e intuições sim, são altamente enganadoras.

 

Vejo só um pequeno e irrelevante problema em tudo isto. O futuro, seja ele qual for, existam as máquinas e os exércitos de analistas que existam, continua a ser a terra do que não se sabe.

Pode o risco ser antecipado e controlado? Pode.

Pode todo todo e qualquer risco ser antecipado controlado? Não, não pode.

 

E sabem porquê? Porque nesse santuário inabalável da objectividade não entra uma variável absolutamente determinante enquanto existir espécie humana e que é a sua imprevisibilidade, a sua natureza surpreendente e a sua capacidade de mudar as regras.

É por isso que algumas empresas, outrora seguras detentoras do trono do futuro, simplesmente desapareceram do mapa.

É por isso que algumas rotinas, que pareceram para sempre imutáveis, um dia mudam.

E é por isso que algumas empresas, infelizmente mais do que seria desejável, recusam de forma obstinada qualquer projecto, experiência, iniciativa com o pretexto de que 'nunca foi feito'. A oportunidade é essa - nunca ter sido feito. Às vezes falha-se, pois é. Mas se nunca experimentarmos, nunca saberemos. Curiosamente são tantas vezes as mesmas empresas que gastam milhares de euros em powerpoints e consultorias sobre inovação. São também as mesmas empresas que descobrem, sempre atrasadas, os fenómenos de mudança e que tentam pateticamente compensar com logotipos o que não fizeram efectivamente na prática.

 

Contaram-me há pouco tempo um episódio ilustrativo.

Por causa da crise, as agências que compram espaços de publicidade nos meios de comunicação, e que na prática são verdadeiros bancos num segmento muito especializado como os media, substituiram vários dos seus quadros por jovens analistas acabados de chegar ao mercado. Jovens, alguns sem dúvida brilhantes, cujo papel é dominar com mestria fórmulas de excel e apresentar projecções e reasons why para o investimento das marcas.

A pessoa que me contou esta história, para o caso um profissional com imensa experiência no mercado de media (e que já trabalhou dos dois lados do mercado, como anunciante e como media) perguntou ao executivo de uma agência porque razão investiam um valor considerável num determinado meio de comunicação, cuja audiência, sendo interessante, é muito limitada a um segmento e em condições muito específicas (desculpem a definição vaga, mas aqui entro nos limites que me imponho de confidencialidade).

Com honestidade, o executivo da agência respondeu-lhe ' não sei, é uma recomendação que me vem no report dos analistas'.

A curiosidade instalou-se e e o próprio executivo da agência foi saber junto do analista em questão porque tinha feito aquela recomendação.

Resposta: porque no cálculo dos indicadores, mostrava que a célula a verde (ou seja, indicação positiva).

Detalhe a reter: o referido analista nunca tinha consultado como utilizador sequer o meio de comunicação em causa, não sabia fisicamente o que era.

 

Dito isto. Se a H3 tivesse analisado o seu negócio à luz dos indicadores existentes, nunca se teria tornado num negócio bem sucedido (uma cadeia - portuguesa - de hamburguers???).

Se a Apple tivesse confiado nos dados já existentes (lembram-se, império Nokia, todos estávamos completamente domesticados àqueles menus e usabilidade), nunca teria trabalhado anos a fio no iPod e num produto gamechanger chamado Iphone.

Se no negócio de internet, só o volume contasse, só teríamos sites de sexo, dietas e mexericos e futebol.

 

Talvez haja uma fé exagerada nos números. Talvez, uma palavra ela própria banida para quem acredita que pode domar toda a incerteza própria do futuro.

Os números são importantes. Mas dizem-nos pouco e às vezes nada sobre essa maravilhosa imprevisibilidade dos seres humanos.

 

Nota: E já agora vale a pena voltar a recomendar o livro Previsivelmente Irracionais, de Dan Ariely. Daqui a uns tempos, falarei aqui de outro que ando a ler.

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por sparks às 14:30

Domingo, 03.11.13

As nossas vidas extraordinárias e banais

 

Ontem fui ao cinema.

"About time", em português "Dar tempo ao tempo", foi o filme escolhido.

Um filme que sai da mesma cabeça e do mesmo coração de quem filmou e escreveu Love Actually e que escreveu Four Weddings and a Funeral. Assim para ir directo à prateleira dos que são filmes de sempre para mim.

 

É um filme de uma sinceridade tão bonita que desafia qualquer cínico a soçobrar. É um filme sobre o que fazemos com as nossas vidas. É um filme sobre o que não fazemos com as nossas vidas.

Se pudessemos viajar no tempo, dentro da nossa própria história, não na grande História do mundo, o que mudaríamos? O que faríamos diferente? Que gaffes evitaríamos e que abraços não deixaríamos por dar? Não é lamechas. É inteligente, burguês, divertido. E é sincero, absolutamente verdadeiro, sem qualquer efeito especial que não as nossas emoções, no nosso próprio carrossel. O que não dissemos aos nossos pais, o que não queremos deixar de dizer aos nossos filhos, todas as vezes que dissemos 'amo-te' à pessoa que escolhemos e que nos escolheu. Lembra um outro filme, The Groundhog Day, com Bill Murray, mas é menos sarcástico e mais puro. E está muito, muito bem filmado, daquela forma que o cinema deve ser, quando um filme nos transporta durante 1 ou 2 horas para outro epicentro que não é o nosso, fazendo-nos acreditar que é o nosso.


Mais do que mudar o rumo dos acontecimentos, Richard Curtis, argumentista e realizador, diz-nos que viajar no tempo seria especialmente útil para apreciarmos cada dia, nem que para isso fosse preciso viver duas vezes cada dia - uma na pressa, com ansiedade, sem tempo para sentir, e outra, vivendo efectivamente os dias. Os bons, os maus, os assim-assim, sabendo que são únicos, irrepetíveis e que por alguma razão vamos um dia ter saudades de um desses momentos banais que deixámos passar sem dar atenção.

As nossas vidas são extraordinárias e banais e o grande segredo de tudo isto é não perder o espanto, a atenção ao pormenor e a doçura de todas as coisas que nos fazem falta sem nós sabermos disso.


P.S. - Só uma pequena nota. Este não é um filme de desafio intelectual nem de prémio em festival de cinema. Mas, o cinema pode ser muitas coisas e uma dessas coisas é de certeza provocar-nos com algumas banalidades (e coisas extraordinárias) que, em regra, estamos demasiado apressados para reparar.

Ou como diz o Daily Telegraph: It’s great to be challenged and needled and stung by cinema, but watching a film needn’t always be a battle; Time is on your side.



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por sparks às 10:27


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